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segunda-feira, julho 20, 2015

   Un dernier café   
(em lembrança à Morangos Mofados, de Caio Fernando Abreu)
   Se conheciam do curso de línguas. Estudavam francês. Uma língua doce e elegante como ambos. Estavam acostumados a falar de si nas aulas. Por isso sabiam de muitas coisas que gostavam: comidas preferidas, cores preferidas, viagens preferidas, filmes, idades, endereço, nome completo, enfim, todas aquelas informações básicas das aulas de conversação que nos  dão a falsa ideia de intimidade.
    Talvez  por sentirem essa amizade, comum a qualquer outro colega de línguas, talvez por desejarem esse convívio, como qualquer pessoa, não foi estranho que tenham ficado conversando no café da escola ao final da aula. Como adolescentes que gaseteiam a aula de gramática para praticar conversação, acrescentaram detalhes que não conviam serem ditos em aula. An pou en fraçaise, outro tanto en portuguese.  Falaram dos mal entendidos em terras estrangeiras, das gafes no ambiente de trabalho, dos erros em situações constrangedoras como dois camaradas de velhas aventuras.
     Disso para os sonhos, foi só uma questão de tempo verbal. Estudavam francês para viajar. Mas ali, juntos, viam que a maior viajem é o que se diz dela. Estudavam para conhecer outros lugares e pessoas. No instante em percebiam o quanto de novidade tinha o aqui e o agora.
    Já não conversavam para exercitar a língua, mas para aplacar a curiosidade que se provocavam.  O café fecha, mas o assunto não se encerra. Uma carona? Mais uns minutinhos de conversa. Claro que sim!
     No caminho se fala da curiosidade por coisas próximas.  Que as palavras criam paisagens e os sonhos viram desejos. Vagarosamente se vai dizendo da vontade de se chegar ao que... está tão perto. Que os corpos são como mundos inteiros. Que as mãos também... passeiam. Se diz que a noite é longa, que o trabalho só começa amanhã. Se ouve um murmúrio, que se responde com um suspiro.
     Em frente ao prédio, o carro já estacionado. Dois olhares e um silêncio. Ouve-se o convite para um último café. Un caffe ? No apartamento! Em casa.
     Avec plaisir.